Indicações de Livros Nacionais.

Auto da compadecida
Ariano Suassuna

O QUINZE
Rachel de Queiroz.

Auto da compadecida
Paulo Coelho

 
 

Uma curiosidade sobre essa obra é anunciada na primeira orelha do livro que, por achar interessante a descrevo resumidamente: o livro foi iniciado em 1946, quando o autor tinha 23 anos e, por desvios da vida, ficou largado até que fosse recuperado e terminado em agosto de 1979, portanto, 33 anos após.

De leitura fácil e agradável, a história de peregrinação de Geraldo Viramundo acontece na região de Minas Gerais. Narrada pelo autor com grande habilidade, este faz, por vezes, uma ligação direta com o leitor, seja explicando determinada ocorrência ou mesmo a razão da estrutura que deu ao texto apresentado. O romance quixosteco é entremeado de cenas cômicas e de heroísmo; de um amor platônico e algumas trapaças; resistência e insurreição.
Em diversas oportunidades o autor faz referência a textos de outras personalidades/autores mineiros, tais como: Carlos Drummond de Andrade (Itabira); Luiz Eugênio Botelho (Leopoldina); e Francisco Iglésias (Pirapora) entre outros. Presta homenagem a seus conterrâneos, pois ele mesmo nasceu em Belo Horizonte e, não por acaso, Viramundo tem passagem por todas essas e outras cidades mineiras.

Muito mais o livro tem a dizer que a humilde capacidade deste relator, não encontra palavras para descrever.



Ainda que a história de Eduardo Marciano seja baseada na autobiografia do autor – isso fica claro na construção dos personagens, cenários e alguns acontecimentos – existem a meu ver, notórias diferenças entre os dois: a determinação, o  trabalho e as  conquistas do segundo.

A reclamação de Antonieta, esposa do primeiro não deixa dúvidas: “... Temperamento Eduardo. Se você fosse diferente, menos torturado, com mais vontade de vencer...Vencer na vida, fazer carreira, ganhar dinheiro, levar uma vida confortável.”

Desde cedo Eduardo apresenta características de ser um egocentrista, com reações agressivas a contrariedade de suas vontades. Passa da infância a juventude, influenciado pelos grandes clássicos da literatura brasileira e mundial. Nos bares da vida, junto aos “ inseparáveis amigos” discute filosofia, literatura, arte e política.  “Todo homem é um incendiário aos vinte anos, e bombeiro aos quarenta”. Por isso mesmo,  com entusiasmo e eloquência, os jovens se agarram ao que aprendem com  seus ídolos da literatura e pensamento,  e partem para o enfretamento do dia a dia buscando superar seus medos, dúvidas e fragilidades, como qualquer um de nós.

Mas a história de uma só vida carrega nela as histórias de muitas outras: de união e separação; sucessos e fracassos; fé e descrença; nascimento e morte, e O encontro marcado com tudo isso torna a leitura deste romance uma grande oportunidade para entendermos que,  o que nos aflige, também atormenta muitos outros brasileiros.
A curiosidade de leitor me fez observar que, embora a televisão tenha chegado ao Brasil, em 1950, e o livro sido editado em 1956, recorrentemente, a história relata uma ida ao cinema depois do jantar. Os principais personagens adoram esse lazer, ou seria o autor? Sim, talvez um costume da época!

Outro fato que chama atenção é a predileção do protagonista mineiro, Eduardo Marciano, por uísque em detrimento da cachaça, bebida tradicional e de grande aceitação entre seus conterrâneos. Seria influência pelo tempo em que Sabino morou nos Estados Unidos?

Em suma, o simples fato da importância deste romance na biografia de Fernando Sabino, já é motivo para sua leitura, principalmente, para quem quer conhecer  a obra de uma das grandes estrelas de nossa literatura.

Contada pelo próprio protagonista, Paulo Honório, inicia-se a história apresentando a clara vocação para negócios, visão empreendedora e algumas tramoias do narrador, como ocorreu quando “Depois da morte do Mendonça, derrubei a cerca, naturalmente, e levei-a para além do ponto em que estava...”, acrescentando “E quem não gostar, paciência, vá à justiça.” Está dado o cenário do regime fundiário no Brasil, no início do século XX. São famosas as guerras entre famílias por uma cerca avançada em terreno alheio. 

A compra da fazenda S. Bernardo é campo fértil para projetos nas áreas de agricultura, pomicultura e pecuária. Imagine então como seria à época o gerenciamento operacional, econômico-financeiro e humano de uma propriedade rural de tão grande dimensão! Muita ignorância, desconfiança e brutalidade na condução do negócio. Além de tudo, por ser o  proprietário um avarento egoísta, negava qualquer incentivo a educação dos caboclos da lida: “Escola! Que me importava que os outros soubessem ler ou fossem analfabetos?” Pensava Paulo Honório. “Metam pessoal letrado na apanha da mamona. Hão de ver a colheita.”

Por conveniência para ambos, Paulo cinquentão casa com Madalena, de vinte e sete anos. Ele em busca de companhia, ela de segurança. Caso recorrente. Mas homem rico, tosco e ciumento é um risco à vida daqueles que rodeiam sua mulher e a ela própria, principalmente, quando além da idade há uma distância enorme na formação ética, moral e educacional entre os dois. “Não gosto de mulheres sabidas. Chamam-se intelectuais e são horríveis.” E quando o ciúme se torna doentio “O meu desejo era pegar Madalena e dar-lhe pancada até no céu da boca.” Não chegou a fazer isso, pois Madalena resolveu o problema de outra forma que não me é permitida comentar, fica ao leitor o convite à descoberta

 


Mestre Ariano Suassuna dizia que temos que ser econômicos com o uso do adjetivo genial, no entanto, essa obra que reúne o conteúdo de dez livros de Marina Colasanti, deixa-nos muito a vontade para usá-lo, pois os contos nele contido são realmente formidáveis.

Especialista em minicontos, a autora apresenta vários nos surpreendem por sua criatividade e pela construção do texto. Como exemplo, o conto sobre A moça tecelã é ótimo.
"Acordava ainda no escuro como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear."

Contos de fadas e de vidas, dadas à natureza e a objetos que compõem um protagonismo singular. “...Um capim alto, com as pontas dobradas como se olhasse para alguma coisa."

As 23 histórias de um viajante, parte integrante desta obra, leva junto não só a imaginação dos ouvintes: “E na quietude que começava a tomar a sala naquele final de jantar,como se soubesse o que ia no coração do príncipe, o viajante contou." Então, também viajará o leitor por um mundo de fantasias e ensinamentos, inclusive de um Rei que tenta enganar a Morte.

Marina diz que o que lhe interessa é a realidade expandida. "De um objeto, não considero apenas seu corpo físico,.... Igualmente reais são para mim seu entorno, a sombra que ele projeta, a sua procedência, ...., o uso a que se destina e o uso que podemos lhe dar, ..." Então, lembramos de que o avião longe de sua ideia original, virou uma poderosíssima arma de guerra! Exageramos?

Pelo exposto, recomendamos a leitura desse livro maravilhoso, aconselhando calma para saborear seus minicontos em toda plenitude, com a oportunidade de repetir "o prato" por quantas vezes quiser. E vocês vão querer!

Um banquete de bons petiscos. Bon appétit!



Livro informativo e bem ilustrado faz uma abordagem sobre os personagens e bastidores de um evento de máxima importância para a história das artes no Brasil.

Tendo como pano de fundo as transformações provocadas por novas tecnologias, industrialização e o inicio de movimentos grevistas na cidade paulista; a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e a Gripe Espanhola (janeiro/1918 a dezembro/1920), a pacata cidade de São Paulo, precisava de um evento para chamar de seu e concorrer com a cosmopolita cidade do Rio de Janeiro. Assim, tudo tem início com a “Exposição de Pintura Moderna”, de Anita Mafaltti, em 1917, que apresenta novas ideias trazidas de seus estudos na Europa. Surgem o impressionismo, expressionismo, o futurismo e o cubismo, “uma ruptura violenta com o conceito tradicional de arte”. Na literatura, abolição de regras e métricas; na pintura, liberdade para o uso formas e cores; tudo isso influenciando músicos, compositores e escultores. Uma revolução!

Nomes importantes participaram desse momento histórico, tais como: Monteiro Lobato, editor e crítico do evento; o pintor Di Cavalcanti, o escultor Victor Brecheret, o poeta Guilherme de Almeida; Heitor Villa-Lobos, compositor e músico, presente em todos os dias da programação do evento. Mas o “Grupo dos Cinco” foi de fundamental importância: Anita Malfatti, Mario de Andrade, Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade e Menotti Del Picchia. “Anita gostava de Mário, Mário gostava da Tarsila. Tarsila gosta do Oswald, que acabou se casando com ela. Mário e Anita ficaram solteiros.”

Penso que a expressão maior dessa época, fica por conta do quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral, de 1928, uma das imagens marcantes do Modernismo, no Brasil.

Por fim, fale a leitura, e vale muito!

 

Todo o encantamento que tive durante a leitura deste livro, transforma-se em lágrimas ao final. Não por decepção, mas por pura emoção. Não por eu ser um avô coruja, mas pela autora ter me mostrado a responsabilidade de minhas ações com minha família, em particular, e com a sociedade, de uma forma geral. E a saudade? Sim, ela está presente em todas as páginas.

Esta obra de Camila Tardelli merece holofotes e o pódio. Através da narrativa de Nathalia, uma adolescente de 13 anos, a autora aborda temas caros à sociedade brasileira, tais como: racismo, fome, miséria, intolerância, relacionamento conjugal, separação e desprezo, responsabilidade social e ambiental, moral, ética, Saúde e Educação. Mas, além disso, fala da literatura brasileira, origem e obras de Érico Veríssimo, Lima Barreto, Cora Coralina, Ariano Villar Suassuna, Thiago de Mello, Machado de Assis, Carolina Maria de Jesus, um incentivo a pesquisa e a leitura.

Durante o auge da pandemia (2020) com todas as regras de isolamento e distanciamento em vigor, a paixão, o carinho e o amor entre a protagonista e seu avô, contagiam e levam a família, os amigos e leitores em uma viagem rica e emocionante, onde, ao final, é pura emoção.

 

Ganhei de presente e amei.
Como enófilo, posso garantir que vale a leitura e tê-lo ao alcance das mãos para consulta.

João Guimarães Rosa foi poeta, diplomata, novelista, romancista, contista e médico brasileiro, comentar os poemas de Guimarães Rosa é difícil pela responsabilidade, mas fácil pela consagração, reconhecimento e premiação de um nome “consolidado na literatura em língua portuguesa, e, sem favor, entre os maiores prosadores...” do século XX, conforme registra o editor do livro Magma.

Contudo, é na declaração do relator do Concurso Literário de 1936, o membro da Academia Brasileira de Letras, Guilherme de Almeida, que percebemos a grandeza da obra do autor em relação aos seus pares à época:

“Concluindo – É, pois, meu parecer que seja o 1o prêmio do Concurso de Poesia de 1936 concedido ao livro Magma, de João Guimarães Rosa: e que não seja a ninguém, neste torneio, conferido o 2o prêmio, tão distanciados estão do primeiro premiado os demais concorrentes.”
(grifo nosso). Particularmente, eu nunca tinha lido algo assim!

Os poemas de Guimarães Rosa são verdadeiras histórias, sem dar importância à métrica ou a rima, mas demonstra toda sua intelectualidade. Se “Boiadas” é um “conto” da lida do homem do gado; com o uso recorrente de palavras do tupi-guarani, Guimarães apresenta “Iara” baseada na lenda da sereia dos rios da Amazônia; “No Araguaia I e II”, “achei um amigo, escuro, de cara pintada e jenipapo e urucum: o carajá Araticum-uassu.” Ele vai além! Brinca com o “Caranguejo” e com as cores, sentimentos e paixões. As aves cantam em seus poemas.

Não se trata aqui de uma leitura de consultório, mas aquela que gosta do silêncio, do tapete vermelho, que dá espaço ao melhor entendimento e a boa interpretação. 

 

Traído pela Sultana, o Califa carrega agora um enorme desprezo por sentimentalismos e emoções. As mulheres de seu harém são descartadas ao amanhecer após uma noite de copulação.

Compadecida e ousada, a filha mais nova do Vizir, Sherezade, decide se colocar em perigo para salvar o destino de outras tantas mulheres que se casaram com o soberano e foram encaminhadas ao carrasco, logo ao amanhecer do dia seguinte. Mas Sherezade tem uma autoconfiança invejável, criatividade e memória formidável, além de ser uma contadora de histórias encantadora desde sempre. E por isso, acredita poder “salvar o Mundo” e alterar o curso da história do poderoso Califa.

Noite após noite, após servir aos desejos sexuais do inquieto Dono, através de uma relação mecânica e entediante, Sherezade o enlaça com histórias sobre Simbad, Zoneida e Harunal-Rashid, alimentando a imaginação de seu Senhor, com histórias intermináveis, postergando assim, o dia do cadafalso.

Dinazarda, sua irmã, a acompanha desde o primeiro momento, mas tem suas próprias ambições e desejos. Jasmine, a escrava conhecedora dos segredos do deserto, é partícipe da conjugação de esforços para o salvamento diário de Sherezade, que por vezes se vê dominada pela força de seus personagens; perde o fio da meada e corre para recuperá-lo antes que o Califa perceba. É tensão o tempo todo. Mas o poder da leitura e da contação de histórias é mais forte do que muitos pensam. Confira com a leitura e ouça as Vozes do Deserto. 

P.S. –Tive o prazer de conhecer Nélida Piñon em um evento na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, oportunidade em que pude testemunhar sua grandeza e generosidade. Simplesmente apaixonante.

Depois de mais de vinte anos desde acontecimento e após o seu falecimento, em 17 de dezembro de 2022, leio o primeiro livro de sua autoria e agradeço a Deus pela oportunidade, pois Nélida é imortal, eu não!